Mesmo com queda nos homicídios, risco para negros aumentou na última década

Mesmo com queda nos homicídios, risco para negros aumentou na última década

Ser uma pessoa negra no Brasil significa enfrentar um risco 2,7 vezes maior de ser vítima de homicídio do que uma pessoa não negra. O dado é do Atlas da Violência 2024, divulgado nesta segunda-feira (12), no Rio de Janeiro, pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP).

Em 2023, foram registrados 35.213 homicídios de pessoas negras (pretas e pardas), o que corresponde a uma taxa de 28,9 mortes para cada 100 mil habitantes. Já entre os não negros — brancos, amarelos e indígenas —, foram 9.934 mortes, com taxa de 10,6 por 100 mil habitantes.

O risco relativo de morte entre negros em relação aos não negros caiu discretamente em comparação a 2022 (quando era 2,8 vezes maior), mas ainda é superior ao índice de 2013, que era de 2,4. Em dez anos, o aumento desse risco foi de 15,6%, o que reforça, segundo os pesquisadores, a persistência da desigualdade racial na violência letal.

“O negro continua sendo o principal alvo da violência homicida no Brasil, e essa disparidade não tem diminuído de forma proporcional”, afirma o estudo, coordenado pelo pesquisador Daniel Cerqueira (Ipea) e pela diretora executiva do FBSP, Samira Bueno.

Ainda que o número total de homicídios no país tenha caído 20,3% entre 2013 e 2023, passando para 45.700 registros no ano passado, a redução não foi distribuída de maneira equitativa. Enquanto a taxa de homicídios entre negros caiu 21,5% (de 36,8 para 28,9), entre os não negros o recuo foi de 32,1% (de 15,6 para 10,6).

O Atlas também destaca que os dados foram coletados a partir de fontes oficiais como o IBGE, o Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) e o Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan), ambos do Ministério da Saúde.

Avanços institucionais e racismo estrutural

Apesar de avanços institucionais nos últimos anos — como a criação do Ministério da Igualdade Racial, a reserva de 20% de vagas para negros em concursos públicos e a equiparação da injúria racial ao crime de racismo —, os pesquisadores ressaltam que o cenário continua marcado por uma estrutura racializada da violência.

“O racismo estrutural segue traduzido na violência letal. Esses números desnudam as desigualdades enfrentadas pela população negra brasileira”, registram os autores.

Violência contra indígenas também preocupa

A pesquisa também chama atenção para a violência contra os povos indígenas. Em 2023, foram 234 homicídios, com uma taxa de 22,8 por 100 mil habitantes — acima da média nacional, que foi de 21,2.

Nos últimos dez anos, a taxa de homicídios entre indígenas caiu significativamente (de 60,5 em 2013 para 22,8 em 2023), mas voltou a crescer entre 2022 e 2023.

O estudo ainda aponta que os estados com os piores índices são Roraima (235,3 homicídios por 100 mil) e Mato Grosso do Sul (178,7). Segundo os autores, a ausência de dados por etnia dificulta uma análise mais precisa da violência enfrentada por diferentes povos indígenas, o que compromete a formulação de políticas públicas adequadas.

Internações hospitalares revelam agressões a povos indígenas

Com base em registros de internações hospitalares entre 2013 e 2024, o Atlas aponta que houve 1.554 internações por agressões contra indígenas. O povo Guarani-Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, lidera com 574 casos — 36,9% do total.

Os Kaingang aparecem em seguida com 142 internações registradas nos estados do Sul e Sudeste. O povo Terena, também no Mato Grosso do Sul, teve 66 registros.

A pesquisa alerta para o impacto do avanço do agronegócio e dos conflitos fundiários, que agravam a violência contra os povos indígenas. “A retomada de territórios tradicionais tem provocado aumento de confrontos armados e agressões físicas diretamente ligadas à luta por direitos”, conclui o estudo.

Share this content:

Publicar comentário