Expansão urbana e agropecuária ameaça sítios arqueológicos no Brasil, revela estudo

Expansão urbana e agropecuária ameaça sítios arqueológicos no Brasil, revela estudo

A expansão de atividades humanas tem se intensificado ao redor de sítios arqueológicos no Brasil, segundo um levantamento inédito realizado pelo projeto MapBiomas. O estudo, divulgado nesta segunda-feira (29), analisou dados de uso da terra entre 1985 e 2023 e revelou que quase metade desses locais históricos — 49,6% — já se encontram em áreas ocupadas por agropecuária, urbanização e outras formas de intervenção antrópica. Em 1985, esse índice era de 41,5%.

A iniciativa, intitulada Cobertura e uso da terra nos sítios arqueológicos no Brasil (1985-2023), mapeou 27.974 sítios em todo o território nacional, com base em registros georreferenciados do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). As informações, agora disponíveis de forma pública e gratuita, permitem comparações históricas e servem de alerta para a necessidade de proteção dessas áreas.

“O cruzamento e a disponibilização destes dados abertos ao público ajudam a entender onde estes sítios estão localizados e se estão sob impacto humano. Isso pode nos gerar um alerta para agir preventivamente”, afirma Thiago Berlanga Trindade, chefe do Serviço de Registro e Cadastro de Dados do Iphan.

O levantamento mostra uma inversão significativa na cobertura do solo nos entornos de até 100 metros dos sítios arqueológicos. Em 2023, apenas 43,2% dessas áreas estavam cobertas por vegetação nativa — índice que era de 53,5% em 1985. A agropecuária passou a ser predominante, ocupando 43,1% dessas zonas.

A coordenadora científica do MapBiomas, Julia Shimbo, observa que muitos desses sítios foram revelados justamente por meio de atividades humanas, como obras de infraestrutura e desmatamento. “Apesar da ocupação humana histórica, agora podemos analisar os impactos recentes sobre essas áreas”, explica.

Distribuição por bioma e estados
O bioma com maior concentração de sítios arqueológicos é a Amazônia, com 10.197 registros, seguido pela Caatinga (7.004), Cerrado (4.914), Mata Atlântica (4.832), Pampa (904) e Pantanal (123).

A Mata Atlântica lidera em proporção de sítios localizados em áreas antropizadas, com 63% dos pontos sob influência humana. A Amazônia registrou um aumento expressivo: de 19% em 1985 para 47,5% em 2023.

Entre os estados, a Bahia tem o maior número de sítios cadastrados (2.718), seguida por Paraná (2.363) e Minas Gerais (2.029). Já o Acre apresenta o maior percentual de áreas antropizadas ao redor dos sítios (89,2%), seguido por Rio de Janeiro (76,1%) e Espírito Santo (75,4%).

Em contrapartida, estados como Roraima, Piauí e Amapá mantêm a maior cobertura de vegetação nativa nas redondezas, com 87,6%, 78,7% e 69,4%, respectivamente.

Desmatamento recente preocupa especialistas
A pesquisa também aplicou alertas de desmatamento entre 2019 e 2024 sobre os sítios arqueológicos e identificou 122 locais afetados. Desses, 79 estão em áreas desmatadas para expansão agrícola. A maior parte está na Mata Atlântica (31), Caatinga (29) e Amazônia (17).

No Rio Grande do Norte, 13 dos 19 sítios com alertas de desmatamento estão ligados à expansão de projetos de energia solar e eólica.

“O cruzamento desses dados permite evitar que a recente ocupação humana destrua a história contida nesses locais”, diz Marcos Rosa, coordenador técnico do MapBiomas.

A cientista da UFSC Marina Hirota reforça a urgência de políticas públicas: “O crescimento das pressões antrópicas ao redor dos sítios reforça a importância de ações de conservação e gestão do patrimônio arqueológico brasileiro.”

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